sábado, setembro 30, 2006
A cena mais bonita que eu já vi.
A filha (Débora Fallabella) protegendo o corpo do pai (Osmar Prado) das chibatadas. Para que ele não seja atingido, ela o abraça e, grávida, leva as chibatadas em seu lugar.
Acho que cenas como esta salvam a humanidade...
***
Uma das coisas que eu mais gosto de fazer é votar e sempre me emociono muito neste dia.
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Quando soube da notícia sobre a tragédia da queda do avião da GOL, estava fazendo prova de Filosofia. Também nunca vou me esquecer da tristeza no olhar do Thiaguinho, que trabalha para a Gol em São Paulo. Na hora eu não dei muita corda, precisava me concentrar. Mas depois...
***
Ando tão cansada que eu nem consigo mais fazer alguma coisa fora do circuito trabalho-faculdade-cama-trabalho-faculdade-cama. Se eu quiser pagar uma conta no shopping, assistir um filme, escrever um pouco, continuar meus projetos, putz. O dia precisava ter umas trinta horas!
Hoje acordei 15h30.
***
Ontem estava triste, odeio odeio odeio querer abraçar e não poder. Querer falar e não poder. Querer ficar perto e não poder. Frustração é a pior coisa que existe no mundo.
Eu percebi que o Alê não estava bem, quando eu falei com ele no telefone.
Gostaria de poder fazer mais do que posso.
Você sabe o que é ver uma pessoa que você gosta se ferrando, trabalhando debaixo de chuva, no frio, sem comer direito e sem vontade...? Ele chegou da rua todo molhado e quando eu ofereci um pedaço de bolo de chocolate-mousse, ele disse: "Não, Mel, eu vou pra casa. Já passei zica demais por hoje"...
Mas o problema não era a chuva, nem a moto que quebrou. Tinha alguma coisa que ele não quis me contar. Na verdade, eu queria que o Alê soubesse o quanto eu gosto dele...
... o final de semana todo vai ser chuvoso.
quinta-feira, setembro 28, 2006
Viver é ser o melhor que podemos ser
Vixe.
Aula de comunicação. Prova. Prática. Medo e pavor. Ela é chata, criteriosa. E louca, acima de tudo. Mas eu adoro a aula dela, adoro e espero ansiosamente a quarta-feira chegar. Queria multiplicar estas quartas por mil. Por quatro anos.
Ela faz a gente crescer. Não é só Comunicação que ela ensina, é a vida. Uma vez eu li uma crônico que dizia para termos olhos limpos para as coisas e a vida seria muito mais interessante. E de fato, nos últimos dois meses eu posso dizer que a minha vida ficou mais instigante depois que me dispus a ver as coisas de uma outra maneira, com um novo olhar. Coisas conhecidas e coisas novas.
Bem, mais pra frente tinha um raio de uma prova prática, que eu não liguei muito pra não sofrer antes do tempo. Ela dizia que não quer saber de prova escrita, porque capacidade de comunicação se entende ali, na raça. E foi ontem, meus amigos... a prova foi ontem...
O trabalho era em grupo e era totalmente prático. Nós inventamos um celular que capta mentiras ("Humm! Te peguei!!!") e eu estou cantando o jingle até agora!!!! Fizemos um trabalho totalmente criativo. Todas as idéias reunidas, todos os esforços reunidos, toda a vontade. Na hora de narrar eu olhei no olho dela e vi no seu rosto, o que mais tarde ela disse claramente para toda a sala de aula:
"Eu estou orgulhosa de todos vocês".
Eu também!!!!!
segunda-feira, setembro 25, 2006
Eu também
Cora Coralina
Escritora goiana do século XIX, semi-analfabeta.
EU CREIO
Creio nos valores humanos
e sou a mulher da terra.
...
Creio na força do trabalho
como elos e trança do progresso.
na força do trabalho
Acredito numa energia imanente
que virá um dia ligar a família humana
numa corrente de fraternidade universal.
Creio na salvação dos abandonados
e na regeneração dos encarcerados,
pela exaltação e dignidade do trabalho.
...
Acredito nos jovens
à procura de caminhos novos
abrindo espaços largos na vida.
Creio na superação das incertezas
deste fim de século.
Creio nos valores humanos
e sou a mulher da terra.
...
Creio na força do trabalho
como elos e trança do progresso.
na força do trabalho
Acredito numa energia imanente
que virá um dia ligar a família humana
numa corrente de fraternidade universal.
Creio na salvação dos abandonados
e na regeneração dos encarcerados,
pela exaltação e dignidade do trabalho.
...
Acredito nos jovens
à procura de caminhos novos
abrindo espaços largos na vida.
Creio na superação das incertezas
deste fim de século.
domingo, setembro 24, 2006
Repúdio
Cada dia que passa eu odeio mais o PSDB.
Cada dia que passa eu tenho mais nojo do Geraldo Alckmin.
Cada dia que passa me assusto mais diante do que as pessoas são capazes de fazer (ou "fezer")
Cada dia que passa eu durmo menos.
Cada dia que passa me decepciono mais com as pessoas.
Cada dia que passa mais me alegro em estar solteira.
Cada dia que passa mais me entristeço por estar sozinha.
Cada dia que passa fico mais receosa de ser inteligente.
Cada dia que passa desaprendo mais sobre as coisas que eu (achava que) aprendi.
quarta-feira, setembro 20, 2006
Pepino do mar! hahahahahahaha!
Estou me sentindo um pouco podre! Já explico por quê...
...fala-se muito da pobre moça que nos meandros da paixão, esqueceu-se de que estava rodeada de seres humanos e que existe a possibilidade de um deles portar um celular, câmera digital ou coisa que o valha.
...a humanidade é sádica. Isto me faz lembrar Nelson Rodrigues. Antigamente eu não gostava do trabalho dele. Hoje em dia eu não adoro, acho que tenho mais o que fazer do que falar sobre incestos e cia. Mas ao menos eu o compreendo e acho que ele tem razão. A humanidade É sádica. Sádica, hipócrita e tudo mais ita, ota e UTA também...
...crucifica-se a menina. Vaca, galinha, os mais infinitos apelidos. Do moço ninguém abre um A.
...até que leio uma nota escrita por um Psiquiatra: nem tudo está perdido, existem mentes sóbrias no mundo. Ele disse que a paixão nos faz perder limites. Nos faz perder a noção de espaço, tempo, risco, consequências. Paixão, química, pele, cheiro. E quem nunca perdeu as estribeiras? Quem nunca "esqueceu" de usar camisinha? Quem nunca perdeu a noção de tudo? Eu já perdi e é muuuuito bom perder a noção de tudo!!!!! Não, não estou falando necessariamente de sexo, agora. Estou falando de paixão!!!!!
... isto posto, hoje acordei me sentindo um monstro. Enquanto todas as minhas amigas a condenam, "mas que pouca vergonha", "que podridão", "creeeedo", eu não vi mal algum.
...sim, mal há porque ela vacilou legal!!!!! Imagina com que cara a pobre vai olhar para o mundo, para o pai, para a avó???? Puuuutz.
...mas cara, QUEM NO MUNDO não fantasia fazer amor no mar???????? Que limites se pode ter quando se está com o namorado, LINDO E MARAVILHOSO, gostoso e saboroso, numa praia, sol, mar, beijo, clima quente e paixão pura no ar?????
Meeeeeu! Vamos parar de ser hipócritas. São duas pessoas de carne e osso, como nós, que sentem tesão, como nós e que perdem as estribeiras - como nós.
Odeio hipocrisia!
segunda-feira, setembro 18, 2006
Curso de Escutatória
Neste final de semana o Estado de São Paulo publicou uma matéria de duas páginas dedicada à discussão da origem do universo. Algo que temos discutido na aula de Filosofia...
Do lado esquerdo, o "cosmólogo" Mário Novello defendia seu ponto de vista baseado na ciência (e no ceticismo). Do lado direito, o filósofo italiano Gianni Váttimo defendia seu ponto de vista do qual compartilho:
"Discutir a origem das coisas é perda de tempo, porque uma vez abordando o assunto, voltamos ao nada".
"A fé é um bom caminho, porque com a fé, não temos a necessidade de explicar coisa alguma".
No artigo, o filósofo também disse que embora verdadeira, a discussão do Papa sobre o islamismo foi descuidada. Ele disse o que disse, em pleno cenário de guerra santa e guerra surda: o homem está com os ouvidos tapados e só escuta aquilo que ele mesmo diz.
Não existe diálogo, não existe entendimento, não existe paz.
Me preocupa o futuro... de novo...
PS: o nome do título é um "termo"' que eu escutei e achei o máximo!
sábado, setembro 16, 2006
Oi!
Ei! Quanto tempo, heim?
Eu não tenho nada de muito empolgante pra te contar, que não seja minha correria, destas que nos fazem segurar o xixi por horas e horas... Queria te contar que eu conheci muita gente nova, gente legal e que tem me feito sair de casa! É! Parece uma vida social... tá com cara. Mas não quero fazer muita festa, prefiro ver pra crer. Mas olha, tem um jeito assim de vida social!
Você acredita que segunda-feira eu tenho prova de Matemática Financeira? Mas sabe, eu saí do desespero. Saí daquela fase de arroxear a cara quando o professor começa a resolver o problema na lousa [lousa é com s?]
Peguei o caderninho e fiquei lá me virando. Deu certo.
Tô levando aquela vida de ler milhares de coisas ao mesmo tempo. Este povo acha que eu não tenho vida social... hihihi. E o meu quarto???? Meu Deus. Hoje saí. E antes de sair, disse à minha mãe:
_ Mãe, aconteça o que acontecer, não abra a porta do meu quarto.
_ Vocês são loucas. - ela disse.
Fui encontrar uma amiga. Ela tem uma casa de chá persa, em Pinheiros. E ontem, sexta-feira, a Folha de SP resolveu publicar uma matéria de página inteira sobre a casa. Conclusão: hoje a casa bombou. O fato é que a única funcionária que trabalha pra ela (e a sócia), pediu as contas. Vixe! Foi Deus quem me mandou lá!!!! Eu nunca lavei tanta louça na minha vida!!!!!
Eu gostei, foi uma experiência ótima!!! E eu comi um lanchinho muuuuuuuuuito bom, de pão sírio, com hortelã, cream cheese, tâmaras e nozes. Nossa!!!! É indescritível a sensação que esta mistura causa.
E não fui ao Estância. Eu ia... mas teve esta chuva e teve estas louças... minha amiga... não fui. Enrolei o babysauro de novo, porque eu disse que ia ligar pra ele se eu fosse. Tadinho.
E é isso. Eu preciso ainda arrumar aquilo (o quarto), estudar um pouco e escrever. E tomar um copo de leite quente.
Vamos aproveitar a vida e ajudar as pessoas. Vamos olhar um pouco em volta. Preciso voltar aqui, porque tenho que contar tantas coisas, tantas coisas novas que eu estou aprendendo! Minhas aulas maravilhosas de quarta-feira...
...OLHAR E VER. Não se deixar ser manipulado (a). Saber dominar, para não ser dominado (a). Saber influenciar para não ser influenciado (a). Saber usar a comunicação.
Ter olhos novos, olhos livres como os de uma criança, para enxergar além, muito além do que aquilo que se olha. Para saber ler as entrelinhas... ´
Quantas coisas estou aprendendo!!!!!!!
Depois volto. São muitas coisas que eu quero contar pra você.
sexta-feira, setembro 08, 2006
Subconto
Santa Cecília
Fazem treze graus. Muito frio e nenhum sono. Tateia as mãos sobre a geladeira, só poeira. Dedos sujos. Acabaram os comprimidos. À noite escuta aquele zunido insuportável nos ouvidos e o tic-tac interminável do relógio de parede. Velho, como é velho aquele edifício. Pela fresta da cortina entreaberta consegue ver o movimento no bar da esquina. Pessoas conversando, como se as horas não existissem, como se o frio não incomodasse, como se a noite fosse dia. Lembra-se dos cigarros que acabaram ontem. Filou um bem ruizinho do cara do 104. Dá pra sentir o cheiro quando coloca a cabeça pra fora da porta. Corredores e escadas infestadas. O zelador passa sacudindo a cabeça. Desisti. Já falei mais de mil vezes pra abrir a janela quando esta porra estiver acesa, minha mulher sofre de asma, porra. Mas não adianta falar com aquele débil mental. Vive de cigarro, café e sexo. Cada noite é uma vagabunda que ele traz pra cá. Gigolô de merda. Este edifício ainda é um lugar de respeito. Respeito. Espelunca, isso sim. O elevador quebrado há mais de um mês. Os técnicos fazendo um puta barulho em qualquer hora do dia. Uma merda de lugar. Cheiro de coisa velha. Não se pode sair do apartamento, se não quiser tomar vários banhos por dia, porque é infestado de pulgas. Os cigarros. Veste a jaqueta de couro e as botas. Com sorte, o porteiro teria um maço sobrando na gaveta. Isso se estiver acordado, pensa. Qualquer dia entra alguém nesta merda, porque o cara dorme na cadeira. Olha no bolso da camisa e não vê nada. Soca o balcão e o velho porteiro pula. Susto. Ce tem um cigarro, velho? Só se você der uma chupada. Porco, eu não vou comer você. Quando vê a porta se fechar, volta a dormir. O vento gelado corta a pele. Põe as mãos nos bolsos da jaqueta e atravessa a rua. O homem que viu pela janela, toma um chope sentado na mesa do canto. Come o palito de dentes no canto da boca. Usa uma boina e uma jaqueta de couro qual roqueiro. Resolve sentar por ali. Vai querer alguma coisa? O moleque vesgo pergunta. Filho do dono do bar. Por enquanto não. O taxista encosta o carro no ponto, estaciona como um porco. Desce cambaleando e atravessa a rua. Bêbado, não lhe tira os olhos. Gostosa, heim. Esboça uma cara de nojo e desprezo, e volta o olhar para a rua. Por detrás dos prédios, o elevado, em silêncio. São Paulo dorme. Figuram os noturnos. Um traveco encosta na porta do edifício, usa uma microsaia de cotton. O taxista sai com o copinho de pinga e coloca o bicho pra dentro do carro. O dono do bar observa, de boca aberta. Percebe ser observada pelo tal cara da boina. Estão sozinhos. O homem bate a unha do indicador na mesa de ferro. Acende um cigarro. Sorri. Seu peito está aparecendo, diz. Abotoou a camisa errado. Acordei no meio da noite, entende. Tava escuro, nem olhei direito. Espero que meus peitos não tenham te incomodado. De maneira alguma. Quer um cigarro? Me paga um maço. E uma cerveja. Eu moro ali na frente. Te vi pela janela. Aquele prédio velho? Passei na frente. O porteiro tá acabado, ali, babando no balcão. Podia ter entrado e comido qualquer uma, ali na frente dele. Não sabe por quê, mas ela curte o seu jeito sem escrúpulos. Não dá pra ser diferente numa noite fria, figurada por travecos e putas, taxistas bêbados, donos de boteco sádicos, cheiro de cigarro e de sexo. Gosto daquele maço azul, com menos nicotina. Você quer comer alguma coisa? Não dá pra comer neste lugar, é infestado de baratas. O cara coça o saco o dia inteiro e se masturba ali no caixa quando vê as putas na rua. Dá pra escutar o barulho do banco tec tec tec tec tec dançando no chão, sem parar. Não como aqui nem fodendo. Eu tô de moto. Quer dar uma volta? Não. Não pensei em sair. Só queria sair um pouco daquela ratoeira, estou sem sono. Quer subir? Arruma os botões da camisa. O convite não tem volta. Claro que o cara não ia negar uma trepada numa noite fria. Tudo bem, eu tô carente, pensa. Segue atrás dela, depois de dar uma nota de vinte para o vesguinho. Atravessam a rua. Passam pelo mesmo velho roncando, com a cabeça jogada no canto da parede. Não, o elevador não funciona, vai ter que ser de escada. Tira os sapatos, que o zelador enche o saco se ouvir barulho. Cuidado pra não escorregar que esta porra de escada não tem corrimão. Você mora no 96? Não. No 98. Este lugar ganha do treme-treme. Há quanto tempo mora aqui? Um ano. Trabalhei na noite, quase não comia. Não vinha pra casa. Já dormi em motel e tudo. Eu cantava. Mas cansei desta vida. Preciso arranjar um trampo, que a grana tá acabando. Acende meu cigarro. Você precisa de dinheiro? Quero ganhar uma grana. Eu te dou, então. Mas você capricha? Sei fazer um lance bem legal. Você tem camisinha aí? Quer onde? Não, na cama não. Ali. O cheiro dele é ácido. Machuca a pele com a barba, mas ela gosta. E gosta da barriga. Só? Só. Mais, é mais caro. Mas agora eu não quero. Tô com sono. Vai embora. Deixa o dinheiro em cima da geladeira. E um cigarro. Você deixa eu tomar banho? Você me dá o maço? Vai. O registro está solto, cuidado pra não deixar cair. Me dá o maço. Ele joga sobre a cama. Ei. Eu tava indo, mas. Tô cansado. Deixa eu dormir ali naquele sofá? Não. porra, deixa! Eu tô cansado, tô bêbado. Não vou conseguir dirigir assim, vou me matar. Não vai dormir em sofá nenhum. Deita aqui comigo. Me dá um cigarro e me dá um beijo. Vem, que é de graça. A noite tá fria demais e este lugar é um lixo. Eu gostei de ficar com você. Ele deita ao seu lado, e a aquece com abraços, arranhos e pêlos. Cigarros, cerveja e sexo. O Edifício Campos Elíseos sobrevive, assim, ao tempo, ao frio, à miséria e à solidão.
terça-feira, setembro 05, 2006
descrer
Frio, frio, frio.
alguma coisa estranha acontecendo, porque o carrinho desce a montanha russa, e estou me segurando firme nas bordas. Não, não ergui as mãos desta vez. Nem fechei os olhos. Os mantive abertos e o que é pior: senti medo. Medo e frio. Você vem se aproximando assim com palavras todas muito bem escolhidas, mas elas batem nas paredes escorregadias da minha atenção.
Desfocada? Não sei. Você tenta de novo, desmancha-se em versos. Mas nada. Nada, por aqui. O carrinho desce com tudo, estou de olhos abertos e mãos firmes. Frio, frio, frio.
segunda-feira, setembro 04, 2006
Sépia
Cenas:
_Air BP Melissa Boa tarde!
_ Quem fala?
_ É a Melissa...
_ Oi Melissa. Aqui é o Gilberto, não sei da onde. Por favor, a Luciana?
_ Coelho?
_ Gilberto!!!!!!!!!!
(hahahahahahahaha. Explicando, afinal não são todos os que entenderão: existem duas Lucianas dentro da empresa, e o sobrenome de uma delas é Coelho...)
O professor entra mudo, enquanto a turma não cala a boca. Começa a passar a matéria na lousa, e todo mundo copia, na maior cara de pau, sem fechar a boca. Entre outras coisas, diz assim:
"as notas promissórias podem ser utilizadas entre pessoas físicas e ainda, entre pessoas físicas e instituições financeiras".
Mais uns minutos e o moleque pergunta:
_ Pssor! Tá errado ali! É entre pessoas físicas e pessoas jurídicas! O senhor escreveu pessoa física duas vezes!
O professor de matemática, um velhinho dedicado e sagaz, vira o corpo lentamente para trás, e volta-lhe um olhar arregalado, cheio de piedade e espanto, enquanto ferozmente circula a conjunção aditiva.
***
Putz, juro que às vezes dá vontade de deitar a cabeça no colo de alguém. O vento ruim passou, hoje me senti bem. Era segunda-feira, mas parecia meio de semana. Nem pesava. Nem ruía. Até ri. Daquele jeito de serelepar pelo corredor deixando ecoar as risadas de criança sapeca. Até esqueci de dar feliz aniversário à alguém. Interrompi sua teleconferência para perguntar-lhe se levava o chaveiro de rapel pendurado no cinto. Arregalou-me os olhos e achou graça. Comi bolachas, almocei mais tarde. Tomei água. Nem abri o jornal, porque tem dias que eu não tenho paciência. Queria fazer tudo o que não cabia num dia, num passo só. De vez em quando, no meio da bagunça, sinto tanta emoção que dá até vontade de chorar, chorar de bobeira, mesmo. De vez em quando eu me lembro de pessoas que nem sei se ainda existem. Pode ser que já sejam outras... e o tempo se emenda e se transforma em vários tempos num só. Várias épocas numa só, várias memórias. Dias coloridos em sépia, em sépia estão meus pensamentos. Voltam um pouco, não muito, mas o passado é tão sagrado e tão frágil que só pode estar colorido em sépia. Assim uma foto envelhecida, mas nítida. Nítida como se fosse próxima, como se nada nos separasse, o ali e o aqui. O cá e o lá. Somos um, mas em diversas cores. Eu queria ser várias, ah, queria. Pra estar onde quisesse. Leve como uma pluma, aquela pena que fica voando na primeira cena do Forrest Gump (eu chorei quando vi). Ela voa e voa e voa... ninguém nem percebe o que está acontecendo, mas olhe! Olhe bem! Olhe como voa! Olhe como ela vai longe, leve, onde quiser, onde tiver que ir, onde lhe permitir. Que saudades que eu sinto de momentos que pararam no relógio. E se eu voltar o relógio pra trás? E se atrasar os ponteiros, e tentar encontrar por um instante um pouco que seja desta existência incandescente que cresce na eternidade?
Pensei em você!